Está disponível no Spotify e em outras plataformas de áudio mais um episódio do “Canalhas!”. Dessa vez, falamos sobre economia brasileira, corrupção, com destaque para os senadores Flavio Bolsonaro (filho do presidente e gênio do mercado imobiliário) e o Chico Rodrigues (aquele do dinheiro na bunda) e, ao final, amenidades.
Eu, William Rabello, Pedro “UmcaraAí” Arthur e Gabriel “Filhão” Loureiro participamos da brincadeira de comentar muito sobre o que entendemos pouco. Como já virou tradição, vou comentar alguns pontos de interesse sobre a conversa.
O link do episódio está abaixo.
A ilustração de capa do episódio foi feita pelo William. Ao final estão ambas as ilustrações promocionais que fizemos.
Para ficar ligado nos próximos comentários, inscreva-se abaixo.
Aproveita e já compartilha o podcast e o texto com quem você quiser.
☀️ Os subsídios à geração distribuída
De maneira grosseira, um sistema de geração distribuída contribui para uma maior economia de energia pois diminui a pressão sobre a infraestrutura de transmissão e distribuição de energia. Além disso, a depender do consumo, um sistema de geração distribuída pode beneficiar outros consumidores com energia adicional (resultante do saldo entre o consumido e o produzido por esse sistema). Com o aumento da oferta de energia, esta torna-se mais barata, em tese.
Apesar dessa menor pressão sobre a infraestrutura de energia, um sistema de geração distribuída não deixa de utilizá-la, mas o faz de forma mais eficiente.
O sistema elétrica é composto de várias camadas: geração, transmissão e distribuição. Dessa forma, a conta de luz inclui algumas variáveis, como o preço da energia em si, além dos outros custos inerentes ao uso da infraestrutura e encargos ligados ao setor elétrico (clique no link - são muitos). A imagem abaixo ilustra o peso de cada componente.
Pela lei, quem possui um sistema de geração distribuída obtém um desconto sobre todas as variáveis acima, de acordo com o seguinte mecanismo: a energia produzida por ele confere “créditos de energia” que, se consumidos por ele dentro de um prazo, geram um desconto na fatura. Em outras palavras, é um sistema de compensação: se alguém injeta energia no sistema elétrico, deveria ser cobrado apenas pela diferença entre produção e consumo, correto?
Acontece que se o sistema de geração distribuída fornece apenas energia para o setor elétrico e o que é compensado é a energia consumida, como ele poderia gerar um desconto sobre todas as componentes da tarifa? Essa forma de desconto é reconhecida por todos os agentes da indústria como um incentivo, ou melhor, um subsídio.
Enquanto escrevia este texto, fui alertado de que apesar de o desconto se aplicar sobre todas as componentes, há valores mínimos a serem pagos - o que não diminui a agressividade do desconto e nem a essência dos subsídios.
Veja como seria o desconto aplicável sem os subsídios:
Aplicar o desconto apenas sobre a componente diretamente ligada à energia representaria um claro desincentivo ao setor de geração distribuída no Brasil, que tem se apoiado em energias renováveis, principalmente a solar. Além disso, os equipamentos necessários para que se instale um projeto de geração de energia distribuída costumam ser muito caros (apesar de baratearem continuamente), de modo que os subsídios fomentariam a instalação de novos projetos.
É verdade também que o setor de geração distribuída é uma indústria bilionária e que contribui não só com a diversificação da nossa matriz energética e com a sustentabilidade, mas também com a geração de empregos.
Por outro lado, aqueles que não têm um sistema de geração distribuída, por mais privilegiados em termos de localização ou eficiência energética que sejam, arcam integralmente com os custos ligados à infraestrutura, os encargos, além dos valores mínimos mencionados acima. Em outras palavras, a única diferença entre os diferentes consumidores de energia se dá sobre o consumo (quem consome mais, paga mais).
Já fiz o meu julgamento no podcast sobre esses subsídios e queria expor apenas os fatos que levaram ao meu julgamento. Claramente existe um “puxa daqui, falta dali”, que deve ser avaliado por nossos representantes. Mas é aquilo, uma vez concedidos os subsídios, é difícil tirar….
💰 Distorções tributárias
Por volta do minuto 28, discutimos que muitas de nossas distorções tributárias estão relacionadas a isenções e outros benefícios tributários concedidos pela União, Estados e Municípios a determinados produtos e serviços. Longe de serem fruto de um debate honesto sobre a essencialidade e/ou conveniência de estimulá-los, ficamos reféns de grupos de pressão que são especialistas em extrair benefícios do poder público. Muitas vezes, esses benefícios tributários prejudicam a maioria da população, ainda que sejam vendidos com um discurso bonito e igualitário.
Para contornar isso, uma das melhores ideias em circulação (sobre a qual, por sorte, não incide ICMS) é a ideia de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Basicamente, ele incidiria sobre todos os bens e serviços consumidos de maneira uniforme, independentemente do lugar de produção. Além disso, o IVA tem sido proposto como solução para unificar diversos tipos de imposto, simplificando os impostos cobrados no Brasil.
Há alguns mitos em circulação em todo do IVA, que são discutidos por Marcos Lisboa, Marcos Mendes e Breno Vasconcelos neste link: aqui.
💳 Austeridade é ruim?
Apesar da pergunta do William, esse assunto foi pouco explorado no episódio.
Dizem por aí que “dívida não se paga, se rola”. Não me surpreende que num país em que as pessoas são endividadas que o governo também se endivide.
As dívidas da União, Estados e Municípios estão descontroladas. Há diversas evidências empíricas sobre isso e vou tomar a liberdade de não colocá-las aqui. Esse fato é incontroverso. No Brasil, o que se discute é se devemos pagar essas dívidas.
Há quem diga que o governo deve gastar, investindo em infraestrutura, educação, saúde, etc. e não se preocupar com a dívida - essa é uma redução um tanto quanto grosseira, mas que circula muito por aí. Não discordo que essas pessoas tenham boas intenções.
Convido essas pessoas a procurarem sobre a natureza dos gastos dos entes federativos no Brasil. Ao invés de investir no futuro, o que poderia gerar algum retorno (financeiro e não financeiro), esses entes gastam em grande parte com o presente (pessoal) e o passado (aposentados).
A administração do governo não deveria ser diferente das finanças pessoais. O endividamento sem limites, ou descontrolado, é um sacrifício do presente pelo futuro. Imagine usar o cartão de crédito em nível superior à sua renda e pagar apenas o mínimo da fatura mensalmente. A dívida irá explodir, não só pela insustentabilidade, mas também por conta dos juros.
No futuro, você pode simplesmente ignorá-la e fugir do banco, esperando que a dívida prescreva. Quando você precisar de um financiamento ou adquirir algum bem, você vai abordar aquele parente com um sorrisinho para que ele “empreste o nome”, porque o seu “está sujo”. Se você não for recusado, os juros cobrados a você serão altos.
Se os bancos tiverem sucesso em cobrá-lo, você terá de sacrificar sua renda com o pagamento dela - fazendo com que sobre menos dinheiro para investimentos em e gastos correntes. É exatamente o mesmo no caso do governo, só que quem paga a conta são todos os brasileiros.
Dito isso, austeridade é ruim? Definindo “austeridade” como ter um orçamento em que o governo arrecada mais do que gasta, tendo a dizer que ela não é ruim, nem boa. É esperada: eu quero crer que o governo deve ter como meta ter um orçamento equilibrado.
É justamente tendo um orçamento equilibrado que o governo pode avaliar melhor onde gastar. Mais do que isso, é aí que sobra dinheiro para gastar. Ter um dinheiro extra para suportar crises é uma boa razão pela qual pessoas devem poupar dinheiro e o governo deve ser austero.
“Ah, mas o governo pode imprimir dinheiro”. É verdade, Ciro. E eu gostaria de imprimir também. No entanto, não é solução mágica, uma vez que pode continuamente diminuir o valor do dinheiro. É o que chamamos de inflação: mais dinheiro perseguindo a mesma quantidade bens e serviços. É justamente por causa da inflação que R$ 1 de hoje tem menos valor que R$ 1 de 1994.
Austeridade é ruim? Quando houver sinal de austeridade no Brasil, podemos voltar com mais calma a essa pergunta.
🍑 Flagras de dinheiro
Abaixo uma coletânea de pessoas que foram flagradas carregando/escondendo dinheiro na cueca em casos de corrupção.
Senador Chico Rodrigues (DEM), 14 de outubro de 2020, foi flagrado com TRINTA E TRÊS MIL REAIS (!!!) na cueca.
José Adalberto Vieira da Silva (na época assessor do deputado José Guimarães), foi flagrado pela Polícia Federal em 2015 no Aeroporto de Congonhas carregando CEM MIL DÓLARES (!!!!!!) na cueca.
Em outubro de 2019, o Prefeito de Uiraúna, João Bosco Fernandes, na Paraíba, foi flagrado colocando cerca de VINTE CINCO MIL reais na cueca.
Alguns bumbuns são gulosos demais…
🎞️ 🎮🎵 📕 Indicações culturais
William pegou todos de surpresa ao inaugurar formalmente o quadro de indicações culturais, mas ficou muito legal. Vejam abaixo as que surgiram nesse episódio.
William: 🎞️ - Age of Samurai (Netflix, 2021, 6 episódios): Reconstituições e comentários de especialistas dão vida à história conturbada e às lutas por poder no Japão feudal do século 16.
Pedro Arthur: 🎮 - Pathologic 2 (Steam, 2019, R$ 66): Pathologic 2 é um suspense dramático focado em narrativa sobre a luta contra uma epidemia mortal em uma cidade rural isolada. A cidade está morrendo. Encare a realidade de uma sociedade em colapso enquanto faz escolhas difíceis em situações aparentemente sem saída. A peste não é apenas uma doença. Você não pode salvar a todos. [Nota: Link da Steam mesmo, se quiser o piratão, vá procurar.]
Paulo (Eu): 🎞️ - Comedians in Cars Getting Coffee (Netflix, 2012, 6 temporadas): O talk show ambulante de Jerry Seinfeld combina café, risadas e carros de colecionador em aventuras movidas a cafeína com os comediantes mais afiados.
Gabriel: 📕 - O estado empreendedor (Mariana Mazzucato, Portfólio, 2014, 320 páginas - R$ 46,32 na Amazon): Uma invenção com impacto enorme na vida de milhões de pessoas, o iPhone costuma ser visto como fruto da mente genial de Steve Jobs e da empresa que ele ajudou a se tornar uma marca mundial bilionária, a Apple. Muitas das tecnologias mais marcantes do aparelho, porém, são resultado de pesquisas financiadas pelo Estado americano, como a tela touchscreen e o assistente virtual acionado por voz, Siri. Essa é uma das revelações feitas por Mariana Mazzucato em O Estado empreendedor, e ilustra bem o principal tema discutido por ela no livro: apesar de ser percebido como lento, burocrático e pouco ousado, o Estado teve e continua tendo papel fundamental e estratégico no desenvolvimento de grandes avanços tecnológicos. Valendo-se sempre de dados fartos e análises bem-fundamentadas, a autora examina outros casos semelhantes em áreas que vão da internet à nanotecnologia e, através de um olhar fresco e muitas vezes surpreendente, enriquece um debate atualíssimo.
🤪 Música de fechamento
Eu adoro sentir o dedo do Pedro Arthur durante a edição, principalmente na música de fechamento.
🖼️ Episódios ilustrados
Como disse lá em cima, lançamos ilustrações para dar uma aspecto mais original para o episódio, o que será feito também para os próximos episódios. As artes foram feitas pelo William - que é um puta ilustrador, diga-se.
Capa do episódio
Promo
Muito obrigado por ter lido. Se gostou, deixe um ❤️ e compartilhe essa publicação com seus amigos.
Se tiver algum comentário, terei o imenso prazer de respondê-lo, seja aqui, no próximo podcast ou numa mesa de bar.
Grande abraço,
Preto, o Verdadeiro Canalha.
[Nota 2: Agradecimentos à Tayná pela revisão do texto.]